sexta-feira, abril 07, 2006

Andrew Eldritch, o padeiro

A avaliar pela generalidade das crónicas ao concerto dos Sisters Of Mercy em Lisboa, o mesmo não terá deixado saudades. É mais ou menos unânime a opinião de que o ambiente foi demasiado decadente, que Andrew Eldritch perdeu o carisma de outros tempos, que os músicos que o acompanham não fazem esquecer Wayne Hussey e Craig Adams, enfim, que os "estes" Sisters são uma sombra dos outros, dos originais. Mas, na forma como se escreve sobre um concerto, há limites para tudo. Há que ter a noção do que se está a dizer, saber do que se está a falar e fazê-lo de forma natural sem tentar fazer-se passar por aquilo que não se é. Vem esta crítica a propósito do texto do Jornal de Notícias, "só" o diário de maior circulação nacional, assinado pelo jornalista Cristiano Pereira. Convido-vos a lerem o artigo, mas gostaria de transcrever algumas partes que achei verdadeiramente incríveis:

"Na noite de quarta-feira, não se descortinavam apenas góticos dentro da sala - e detectavam-se muitos outros com um look mais "motard", halterofilista ou o somatório desses dois filtrado por uma estética mais metaleira."

O que será um "look halterofilista"? Será alguém que vai para o concerto assim? E o que exactamente significa o somatório de um "motard" com um halterofilista filtrado por "uma estética mais metaleira"? Conseguem visualizar? Ou precisam de uma dúzia de cervejas?

"Todavia, o concerto não registou grandes surpresas a formação limitou-se a despejar alguns dos seus 'hits' mais famosos de uma discografia que não conhece novidades há uma década e meia - "Alice", "Romeo down" ou "Anaconda", por exemplo."

Qualquer pessoa com um conhecimento mínimo de Sisters Of Mercy saberá que existem pelo menos umas 3 canções tocadas no concerto que estão claramente acima das citadas pelo jornalista como "hits mais famosos" (uma redundância, mas tudo bem). Exemplos? Dominion, Lucretia My Reflection e Temple Of Love. E referências ao facto de o álbum First And Last And Always ter sido "esquecido"? Nenhuma.

"Só que, ao contrário dos Bauhaus - que sempre se pautaram por uma arte muito mais convincente"

Opinião pessoal do jornalista à parte - ele tem direito a ela -, o que é uma "arte muito mais convincente"? Quer dizer que é feita pelos músicos e não por outros, como acontecia com a "arte" dos Milli Vanilli? Quer dizer que convence os fãs de alguma coisa em concreto?

E finalmente a parte que mais me... ora bem, como é que eu hei-de dizer... deixa cá ver... me... impressionou negativamente, para ser simpático e não dizer qualquer coisa como "me deixou escandalizado pela pobreza de espírito do jornalista". Sem mais comentários:

"Ou seja a banda, que nem nos seus tempos áureos chegou a ser grande coisa, está, há muito, fora do prazo de validade. Perceber as palavras libertadas da boca de Andrew Eldritch, por exemplo, afigurou-se tarefa difícil; dir-se-ia, aliás, impossível: o homem insistiu em cantar como se fosse um padeiro engasgado na sua própria farinha num estabelecimento de panificação numa madrugada de nevoeiro."

Sem comentários: